TCU arquiva representação de Carla Zambelli por desvios na Ancine
O relator, ministro Bruno Dantas, ao votar pelo arquivamento, destacou a tentativa de uso inadequado da instituição pela parlamentar.
Da Redação
quarta-feira, 29 de janeiro de 2025
Atualizado às 19:01
Por unanimidade, o TCU decidiu arquivar a representação apresentada pela deputada Federal Carla Zambelli, que apontava suposto desvio de finalidade na destinação de recursos públicos pela ANCINE – Agência Nacional do Cinema.
A parlamentar alegava que a empresa Descoloniza Filmes teria sido beneficiada irregularmente, mas o tribunal concluiu que não havia indícios suficientes para dar prosseguimento à denúncia.
Parentesco suspeito
A deputada afirmou ter tomado conhecimento, por meio de publicações em redes sociais, de um possível favorecimento na liberação de R$ 576 mil para três projetos audiovisuais da empresa Descoloniza Filmes e Produções Artísticas Ltda.
Segundo ela, a relação de parentesco entre um dos sócios da produtora, Ibirá Perrucci Toledo Machado, e a jornalista Daniela Lima, da GloboNews, levantava suspeitas de direcionamento político na concessão dos recursos.
Entre as medidas solicitadas ao TCU, a deputada pediu a convocação de representantes da Ancine para prestar esclarecimentos e a verificação do cumprimento das normas aplicáveis ao setor.
Leia Mais
TRE/SP forma maioria pela cassação do mandato de Carla Zambelli
Voto do relator
O relator do caso, ministro Bruno Dantas, reforçou que a liberdade de expressão não pode ser utilizada como critério para impedir o acesso de qualquer cidadão ou empresa a políticas públicas de fomento cultural.
“Manifestações públicas de apreço ou desagrado em relação a governantes, suas administrações e posições ideológicas não são motivo de óbice à contemplação desses manifestantes por políticas de fomento cultural, sob pena de se atentar contra a liberdade de expressão”, afirmou.
Dantas destacou ainda que a tentativa de vincular o recebimento de recursos por parte da produtora ao posicionamento da jornalista configura um uso inadequado das instituições públicas. “O que se tenta fazer é instrumentalizar este Tribunal de Contas da União para tentar silenciar a voz de jornalistas críticos a determinadas linhas políticas”, disse.
O ministro ressaltou que tanto os editais quanto a captação de recursos ocorreram durante o governo anterior, o que reforça a ausência de qualquer relação entre o processo de seleção da Ancine e as opiniões políticas da jornalista mencionada.
“Além de absolutamente infundada, sequer seria verossímil, porque fazer uma associação entre a atuação de um jornalista e um benefício obtido por um parente distante seu, que está previsto em lei e é incentivado pelas normas do Brasil, não é a melhor forma de se trazer temas ao órgão máximo de controle externo do país”, afirmou.
Dantas também citou precedentes do STF sobre assédio judicial contra jornalistas e mencionou dados do monitor de Assédio Judicial da Abraji – Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, que apontam uma tendência global de tentativas de silenciar jornalistas críticos por meio de demandas judiciais.
Segundo ele, o uso do TCU para essa finalidade é preocupante. “Este tribunal tem o dever de proteger os princípios republicanos e a integridade de suas competências. A instrumentalização de nossas instituições para fins de intimidação ou perseguição é inaceitável e contrária ao papel constitucional que esta Corte tem como guardiã da legalidade e da transparência”, concluiu.
Veja a íntegra do voto:
Análise do TCU
O tribunal concluiu que não havia elementos concretos para sustentar as alegações.
Os três projetos mencionados – “Dorival Caymmi – Um Homem de Afetos”, “Felicidade” e “Para Onde Voam as Feiticeiras” – foram aprovados dentro das regras e diretrizes da Ancine.
Além disso, dois desses projetos haviam sido selecionados em anos anteriores, ainda durante o governo passado.
A auditoria do TCU também verificou que a Descoloniza Filmes teve 21 projetos habilitados na chamada pública BRDE/FSA – Produção Cinema – 2023, mas apenas um, “Minha Carta para Bergman”, foi efetivamente contemplado com recursos, sendo que a execução financeira caberia a outra produtora, a Cinemascópio Produções.
Diante da ausência de provas que indicassem qualquer irregularidade, o plenário do TCU decidiu, por unanimidade, não conhecer a representação e determinou o arquivamento do caso.
A decisão foi tomada com base nos arts. 235 e 237 do regimento interno do tribunal, que exigem indícios concretos para o processamento de representações.
Fonte: